sexta-feira, 30 de outubro de 2009

Minhas músicas - "Todo Dia Suicídio"

Masoquistas que somos, ao invés de fazê-lo de vez, muitos de nós optamos por nos suicidar um pouco a cada dia. O irônico é que, no mais das vezes, levamos nisso tanto tempo que, antes que terminemos, vem a morte e nos leva...

TODO DIA SUICÍDIO

Às vezes eu caminho mas não saio do lugar
Às vezes eu me perco sem nem mesmo caminhar
Às vezes solidão na multidão
Às vezes lua cheia e mãos vazias
Às vezes eu começo e quase nunca eu chego ao fim
Às vezes eu tropeço e quase sempre eu digo sim
Às vezes solidão na comunhão
Às vezes vento frio e tempestade

Um tiro, a morte, o gozo, enfim o dia
Um salto no vazio, espasmo e breu
Um sono eterno, inverno em vigília
Nada nem ninguém, silêncio e eu

Às vezes toda a vida me parece ilusão
Às vezes eu me iludo e a vida toda vai ao chão
Às vezes nunca mais recomeçar
Às vezes todo dia suicídio

Um grito, a sorte, o mar e enfim o porto
Um salto no jamais e em paz a cruz
Na bala a caminho do meu corpo
O brilho é a derradeira luz

Às vezes toda a vida se extravia em seu pulsar
Às vezes todavia a vida pulsa sem parar
Às vezes quase nunca eu tentaria
Às vezes todo dia suicídio

Um tiro e enfim a vida se esvazia
Um salto, o céu, o chão, atalho, adeus
Um sono eterno ao sol de um novo dia
Nada nem ninguém, silêncio e eu

Gugu Keller

domingo, 25 de outubro de 2009

Minhas músicas - "Desabafo"

Às vezes fico pensando... O ato de desabafar, sempre tão clara e desesperadamente necessário, é, de um ponto de vista puramente racional, tão desprovido de sentido... Sim, pois, afinal, de que nos serve, sempre a pensá-lo racionalmente apenas, que outrem tome conhecimento de nossa dor? Em que isso a diminui? É que, tendo a assim crer, precisamos nos apegar à consciente ilusão de que não somos enfim tão sós. Mas definitivamente somos. E esta nossa gigantesca solidão vem do decerto inequívoco fato de que cada um de nós está irremediavelmente fadado a ser o único a sentir e pensar em seu próprio universo psíquico. Ou não é assim? De todo modo, desesperados, desabafemos...

DESABAFO

Eu quero dar tiros no escuro
Pois eu não acredito em acaso
Dar de dor gritos arte transmuro
De um preso sem prazo
Desejo de aparte e ar puro

Quero juntar e colar meus pedaços
Com fé e com esparadrapo
E afinal ver passar o passado
Sem medo eu a nado
Meus dedos aos teus atrelados

Eu quero poesia
Prazer, prosa e prozac
Eu quero pele, um par de peitos, pouso e pão

Eu quero dar murros no espelho
Pois eu não assimilo o destino
Jorrar fulo o meu sangue vermelho
Meu ulo canino
Meu pino, nariz no joelho

Quero beber toda a água da chuva
E toda a que dorme nos lagos
E ver a vida já não treva turva
Mas a erva e o trago
Na trégua em teus braços e curvas

Eu quero uma porta
Um porto, a ponte, um parto
Eu quero o preço da passagem, plus paixão

Eu quero dar giros no espaço
Pois eu não admito limites
E segurar os vampiros no laço
Entrar sem convite
Nos riscos no próximo passo

Quero estar todo desamarrado
Desamordaçado ao léu
Eu quero ser eu ao contrário
E, desnudo e sem céu
Ter-me todo e pra tudo ao teu lado

Eu quero uma prova
A pedra, o pó, a picada
Eu quero prece, um passe, pausa, pulso e pus

Pré pacto pá e palavra, apraz-me cada
Por paz pós pés no nada, a espada e a cruz

Gugu Keller

sábado, 24 de outubro de 2009

E

Estimados entrantes estimuladores...

Escrever evoca-me experimentar estilos especiais, embora eventualmente estranhos. Esforço-me entrementes em emocionar empregando estruturas excêntricas e esdrúxulas, esquálidas, esguias e esquizofrênicas, e, entretanto, esperta e estrategicamente excitantes. Egocêntricas eventualmente. Esmero-me em estreitar estradas enlameadas, emborcar entradas entrecortadas, explorar estrelas, espumas, estufas, escuras escunas. Escuto. Escorrego, esgueiro-me, espio e espiono. E escolho enfim expiações etéreas entre estrofes ecumêmicas e estribilhos efusivos, e espreito engates, engodos, egos engajados, esqueléticos entroncamentos em entranhas esquecidas, evadidas, exaustivamente esquadrinhadas. É. Excelsas etílicas experiências espocando em escabrosas escolas esotéricas, escatológico esporte, endorfina.
Estudo, esquartejo, emaranho. Escolto e envolvo. E enamoro então elementos emocionantemente esquisitos, erguendo esculturas éticas enigmáticas em ecos enfaticamente efusivos, encaixes equanimamente exatos, eretos, estonteantemente evolutivos.
E, é, esperança eis. É, eis. E espero eloqüente expurgar, em emparelhadas e enaltecidas equações estimulantes, estâncias eqüidistantes especificamente expostas em elos empíricos, exceções. Enlevos, encantamento, êxtase, espíritos enxutos em elevação. Encontros, emoção, emergência. Espera, esperma, envolvimento, ejaculação. Expressão exultante, espumante e entumecida. Estrondo, estopim, estrago. Engolir, esôfago, estômago. Equinócio. Espúrio estupro extrasensorial. Epíteto, epígrafe, epitáfio. Eterna emoção, escrever. Encontrar, encartar, emoldurar, embrulhar. Escrever.
Espera-me, enfim, então, enobrecer, exaltar, extasiar-me especial evento estímulo estimados entrantes enxertando energia este espaço. Encantado. Enormemente encantado e envaidecido. É. E esboço enervado externar elegância expressiva enaltecedora eletrizante emoção. Eletrocutante emoção. Estóico, e em essência enluarado enquanto entre estas épicas empreitadas, entregue empregarei exaustivo esforço encontrar-me em eterno ectoplasmal etnológico embate. Eterno envolvente enlace. Explosão. Estridente e explicitadora explosão. Entes e escritos. É. Entes, escritos e eu. Esta esfíngica estátua em espasmo, eu.

Gugu Keller

sexta-feira, 23 de outubro de 2009

Gritos por Escrito

Tem dias em que não é para escrever, mas para socar, agredir as teclas do meu computador, que diante dele eu me sento. Não para dizer ou rimar, ou compor, versar, mas para disparar, torpedear, metralhar as minhas letras contra o mundo. É. Sento-me cheio de fúria, de ódio, de energia, de indignação. O que quero é fazer barulho, soltar urros, ulos, bater, chutar, esmurrar, quebrar tudo. Escandalizar, mudar conceitos, esbravejar, destruir toda essa coisa errada e torta com sílabas sulfúricas, entrecortadas e espumadas. Expirações quentes, dentes, gotas de saliva. Sim, gotas de saliva no meu monitor. Palavras liqüefeitas em fonemas atropelados. Soltar o que está preso na prisão do pensamento. Púlpito. Solfejo de notas soturnas e sincopadas. Sons. Sons, suor e idéias. Idéias. Idéias, vácuo, pressão, redemoinhos. É, tem dias em que é assim. Escrever, outrora tudo, já não basta. Não, absolutamente não basta. Preciso fazer tremer, abalar, sabotar. Dinamitar, detonar. É. Pôr abaixo. Abaixo toda essa estrutura maldita, toda essa hipocrisia desmedida, todo esse engodo disfarçado e ciclicamente autofágico. Travestismo dogmático, pantomima tragicômica, inversão do próprio avesso. Dismorfismo disforme. É. Sim, não, escrever só não. É. Já não, não basta. O que quero é fazer das palavras pedras. Pontiagudas pedras para bodoques e vidraças. Vitrines, vitrais públicos da incoerência humana. Boca, balas, bombas, bazucas. Tiros, atropelos, atentados. Fonocardioejaculação. É, é só o que eu quero. Mais do que falar, pôr para fora. Expelir, vomitar, devolver. Escrever estranhamente nada e dar ao mundo este meu estranho tudo. É, quero. Quero, preciso, necessito. A faca sobre as teclas abrir um buraco em meu peito. Corte, coragem, covardia, contusão. E, sim, que vase sobre as letras, teclado, a coisa toda. Sangue. Que venha, venha tudo. Meu desespero contido, minha fuga contínua, meus sonhos perdidos. Minhas dores e doses, depressão disfarçada. Minha perene saudade do que eu seria e nunca fui. Agonia de desde sempre todos os dias. Desejo de sempre, todos os dias, dormir até um longínquo amanhã.
Tem dias, meus amigos, em que, sim, é assim. O escritor o escrever não leva a nada. Para escrever eis o escritor já sem palavra. Não, ela já não lhe basta. Nem o tudo nos basta, amigos, quando todo o sentido é um nada.
Tem dias, meus amigos, em que não é para escrever que eu me sento. E, sim, hoje é assim. Não, não quero escrever. Não devo, não posso, não vou. Nem sequer haveria o quê. Só quero, nu, isso sim, e quem dera eu, amigos, o saiba, apenas gritar por escrito. É. Sem palavras gritar por escrito.

Gugu Keller

terça-feira, 6 de outubro de 2009

Minhas músicas - "Anticonstitucionalissimamente"

Ao contrário do que muitas vezes eu ouvi, sobretudo na minha infância, "anticonstitucionalissimamente" não é a palavra mais longa da língua portuguesa. Parece que há um termo médico que é maior. De todo modo, durante um bom tempo tive o plano de fazer uma música que em a usasse. Certo dia a coisa enfim acabou saindo e fiz dela inclusive o título. Tempos mais tarde, descobri por acaso que há uma antiga marchinha de carnaval, mas antiga mesmo, dos tempos de Lamartine, que igualmente a usa e toma como nome. Mas sem problema. A minha é um rock e, exceto pela homonimia, nada tem a ver.
ANTICONSTITUCIONALISSIMAMENTE
#
O que é que você faz quando age o presidente
Anticonstitucionalissimamente?
O que é que você faz quando vence o candidato
Hipervideoradiomultimidiocratizado?
O que é que você faz quando a fome é uma certeza?
Chese-burger-egg-bacon-maionese-calabreza!
O que é que você faz quando vê o seu passado
Sigmundfreudianamente analisado?
#
Nada dá mais lucro que a crise
Reprise às vezes é criação
O presente é permanente no país do futuro
Mas eu agora digo que não
#
O que é que você faz em auxílio ao idoso
Pulmo-cárdio-vaso-hepato-reno-canceroso?
O que é que você faz quando assiste a este engano
Anglo-saxo-franco-luso-afro-americano?
O que é que você faz pelo povo afinal
Analfabetizado em extensão ginasial?
O que é que você faz a cada 22 de abril?
Recôncavo soteropolitano do Brasil
#
Nada é mais para sempre que o nunca
E nunca nunca é solução
O presente é para sempre no país do futuro
Mas eu agora digo que não
#
O que é que você faz quando vem o seu salário
Pseudoindexadamente superavitário?
O que é que você faz para estar sempre plugado
Globomacromundiciberninternetizado?
O que é que você faz para ter seu calhambeque
LS plus, 2.0, com air-bag?
O que é que você faz quando age o presidente
Anticonstitucionalissimamente?
#
Nada é mais moderno que o agora
E a hora é de voltar à razão
O presente é o de sempre no país do futuro
Mas eu agora digo que não
#
Gugu Keller